16 de janeiro de 2015

Jijoca de Jericoacoara- 'Paraíso cearense' ameaçado por atitudes predatórias

O medo de perder Jeri para a insegurança, o tráfico e a desordem têm atormentado moradores e visitantes


Belezas da vila são comprometidas por problemas crescentes Jijoca de Jericoacoara Os visitantes ainda andam descalços e, em boa parte, despreocupados pelas ruas que, sem pavimentação, tentam conservar as características originais da vila de pescadores, de visual incomparável. Um dos principais destinos do turismo no Ceará, localizado a cerca de 300 Km de Fortaleza, a Praia de Jericoacoara enfrenta problemas que comprometem esse cenário paradisíaco.
O medo de perder Jeri para o desordenamento, a insegurança, o tráfico e a sujeira, atormenta. Em um dos locais mais lindos e visitados do País (em 2013, a vila recebeu 610 mil turistas nacionais e internacionais), duas certezas são unânimes: para Jeri sobreviver é preciso barrar a conduta predatória e o poder público precisa agir urgentemente.
A vida pacata na Praia, distrito do município de Jijoca, no decorrer dos anos, tem sido ameaçada. Entre os que habitam de forma permanente a vila e os que fazem de Jeri o destino certo nas folgas, a avaliação é de que o assassinato da turista italiana, Gaia Molinari, no mês passado, foi um episódio pontual. Porém, outros males, como o crescimento do tráfico de drogas, o aumento de pequenos roubos e furtos e até casos de estupro, preocupam e transformam a rotina.
A percepção foi comprovada no reencontro da turista Leoniza Oliveira com Jeri, que ocorreu nesta semana. Após 15 anos da primeira visita, a atual situação trouxe a certeza para ela de "estar visitando outra localidade".
Transformações
A suposta tranquilidade foi o atrativo que moveu a psicóloga, moradora de Iperó (SP) rumo à vila. Mas, no reencontro a expectativa não foi correspondida integralmente. "Antes, era mais preservada, tranquila. Agora, cresceu muito e a segurança não acompanhou. Hoje, eu tenho receio de andar por aí", garante.
Ainda assim, Leoniza e outros tantos turistas e nativos tentam não sucumbir. Apesar da intensificação da sensação de risco ao percorrer a trilha do Serrote (trecho onde a italiana Gaia foi assassinada), que leva à Praia da Malhada, o percurso não foi abandonado. Na alta estação é frequentado por grupos e até por pessoas desacompanhadas, embora não tenha policiamento. "Este local, que tem uma vista panorâmica, deveria ter uma guarita, pelo menos com guardas florestais. Isso garantiria mais segurança. Até porque é uma área que merece atenção para a preservação ambiental", avalia.
Não há iluminação no entorno da trilha e dentro da vila não há postes elétricos. O serviço é garantido nas pousadas, restaurantes e residências. Durante três dias, a equipe do Diário do Nordeste esteve em Jeri e, ao percorrer as ruas, confirmou que a pouca iluminação mantém o clima rústico, mas também amedronta quem tem de passar pelas vielas.
Drogas
"A Polícia está muito mais preocupada em terminar as festas cedo do que atuar de forma ostensiva para combater o tráfico de drogas, por exemplo", garante a proprietária de um bar em Jeri que não quis ser identificada. "A frente do meu restaurante virou um ponto de drogas durante a madrugada e a Polícia passa e não faz nada", queixa-se.
De acordo com ela, o tráfico de entorpecentes tem afetado a vila nos últimos anos e a população sabe onde estão localizadas as "bocas de fumo". A violência, que não ocorre de forma massificada nem armada, para os moradores, consiste, hoje, na invasão de residências para roubar celulares, computadores e outros pequenos objetos de valor, além do medo do assédio à população feminina.
Pelas vias de Jericoacoara, não é difícil deparar-se com pessoas usando drogas. Nossa equipe presenciou diversos grupos fazendo uso de entorpecentes, sobretudo de maconha, em vários pontos da vila. Na praia, a situação se repete. Em grupo ou sós, usuários consomem a droga de forma livre.
"Não tem policiamento a pé e a segurança é complicada", lamenta a dona de uma pousada e um restaurante, Sônia Cavalcante. Ela critica, ainda, que, diante de uma ocorrência, sequer é possível registrar o caso no distrito, já que o local não tem delegacia. "Um ladrão, que era de Camocim, entrou na minha casa e conseguimos prendê-lo. Mas passamos cerca de 10h na Delegacia de Jijoca para fazer um Boletim de Ocorrência", conta.
Questionado sobre a situação e sobre o diálogo com o Governo do Estado por mais segurança, o prefeito de Jijoca de Jericoacoara, Francisco Lindomar (PSD), é categórico "tenho uma decepção muito grande com a segurança pública. A própria Polícia vê o consumo de drogas a céu aberto e não se faz nada, dando a ideia de que em Jeri tudo pode".
Lindomar afirmou ainda que "tem conhecimento de que Jericoacoara é um portal que acolhe traficantes famosos, inclusive internacionais". Mas, apesar de questionado sobre a atuação do município, ele limitou-se a dizer que espera que a Polícia Federal juntamente com a Polícia Civil "possam se colocar mais à disposição" e que espera "mais rigor das instituições policiais".
FIQUE POR DENTRO
Delegacia mais próxima fica a 24 Km
Jericoacoara não tem delegacia. A unidade mais próxima fica em Jijoca, a 24 Km da vila. Segundo o titular da Delegacia Municipal de Jijoca, Flávio Artur, o funcionamento é apenas de segunda a quinta e as ocorrências do fim de semana vão para a Delegacia Regional de Acaraú, que fica a 61 Km de Jeri. "Nós temos é carência de pessoal", garante. Os registros policiais mais recorrentes em Jeri são pequenos furtos e ameaças. Em 2014, a Delegacia contabilizou também sete estupros na região de Jijoca.
A vila, segundo o subtenente Roberto, do Batalhão de Policiamento Turístico (BPTur), que comanda a unidade na vila, conta com sete policiais, que atuam em dupla, por turno e fazem a ronda motorizada em um único veículo. "Tentamos combater o tráfico, mas precisamos da atuação de outras forças como a Divisão de Narcóticos e a Polícia Federal", ressalta.
A Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), em nota, garantiu que a segurança da vila foi reforçada desde dezembro até o Carnaval. A equipe do Diário, porém, não verificou a presença deste efetivo complementar. A SSPDS explicou, ainda, que foi feito estudo de sazonalidade por ser uma área turística e o delegado mais experiente, Flávio Artur, assumiu a Delegacia de Jijoca para reforçar as ações de inteligência.

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