23 de janeiro de 2015

INVESTIMENTO QUE SE PAGA Consumidor parte para gerar a própria energia

Uma das opções é a instalação de placas fotovoltaicas que captam luz solar Em um ano de incertezas em relação à economia do País, uma coisa, ao menos, está definida: o consumidor pagará bem mais caro pelo seu consumo de energia elétrica. Quando o próprio ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, apela a Deus para a melhoria do cenário de chuvas e apresenta como "consolo" aos consumidores a garantia de que a alta nas contas de luz ficará "abaixo dos 40%", é hora de se preparar para o aperto.
Alguns empresários e consumidores residenciais, contudo, para fugir dessa turbulência, estão apostando na micro e minigeração de energia elétrica, produzindo sua própria eletricidade por meio da instalação de placas fotovoltaicas, que captam a luz solar. Este é o caso do autônomo José Edson Gomes, de 50 anos. "Eu estava vendo que não chovia nem aqui nem no Sudeste e que não havia nem previsão de a situação melhorar. Então, decidi fazer alguma coisa, porque a minha conta de luz já estava vindo muito alta e deveria ainda aumentar", justificou.
Curioso, nas suas pesquisas na internet viu a oportunidade de instalar em sua residência, no bairro da Maraponga, os painéis solares. Como já tinha economias, investiu R$ 12 mil para instalar cinco placas do tipo em sua casa, com a perspectiva de ter uma redução de 40% a 50% em sua conta de luz. "Estou aguardando a conta do próximo mês para ver o resultado, mas acredito que tomei a decisão certa, investi alto nisso", conta, informando que quatro de seus amigos também estão à espera do resultado para decidirem se também irão instalar em suas casas. Esta possibilidade tornou-se real desde a publicação da Resolução 482/2012 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que permitiu ao consumidor gerar sua própria energia elétrica por meio de fontes renováveis - o que inclui também a matriz eólica, entre outras - e, inclusive, fornecer o excedente para a rede de distribuição de sua localidade.
Pouco aproveitada
Quase três anos após a norma entrar em vigor, a possibilidade ainda é pouco aproveitada nos lares e estabelecimentos brasileiros. De acordo com dados da Aneel, existem apenas 307 empreendimentos de micro e minigeração registrados pela agência, número este que ainda não foi atualizado por todas as distribuidoras do País. Apesar de a quantidade não ser muito significativa diante de todo o universo brasileiro, esta alternativa começa a ser mais procurada este ano, diante dos tempos de crise no setor elétrico.
A procura tem sido percebida sensivelmente no Ceará. Ainda conforme os dados da Aneel, o Estado participa com 13% do total de empreendimentos do tipo no Brasil. A Companhia Energética do Ceará (Coelce), aliás, atualizou os dados, informando que já recebeu 80 solicitações de clientes atendidos em baixa tensão e já conta com 57 atendimentos, sendo 42 clientes residenciais, 10 comerciais, quatro industriais e um de poder público. Outros 23 projetos estão passando pelo processo de aprovação.
Ideia antiga
Entre os projetos comerciais, está o da construtora e incorporadora Idibra Participações Ltda. De acordo com a supervisora de Planejamento da empresa, Camila Mareco, a ideia de construir prédios com a tecnologia solar já existe desde de 2005, mas o primeiro projeto foi lançado em 2007, tendo sido entregue em 2010. Hoje, os projetos da empresa incluem a instalação de painéis solares e aerogeradores.
"Usamos isso ainda a título de educação, pois ainda é muito caro manter todo o consumo dos condomínios com geração própria", explica. Entretanto, uma função que ela destaca foi a substituição dos chuveiros elétricos pelo aquecimento com energia solar em todas residências dos condomínios. "Só isso, já dá, certamente, uma grande economia para as pessoas", destaca.
Consumo interno
Camila Mareco informa que toda a energia produzida pelos aerogeradores e pelos painéis é consumida no condomínio, o que já reduz na utilização da energia vinda da distribuidora. "Independentemente da crise no setor energético, estamos sempre procurando fazer um upgrade nos painéis solares, buscando maior potência, buscando alternativas que barateiem o custo das placas", aponta.
Mareco ressalta ainda que o único empecilho para o maior avanço nesse tipo de energia é a falta de área de cobertura, uma vez que os equipamentos ocupam muito espaço.
Venda de placas deve dobrar
A atual situação energética brasileira deverá contribuir para a elevação das ligações de micro e minigeração no Brasil e, especialmente, no Ceará, segundo acredita o diretor administrativo-financeiro da Satrix Energias Renováveis, Francisco Bastos. A empresa é pioneira e líder no Nordeste no setor de geração distribuída e produz aerogeradores de baixa potência, além de distribuir painéis fotovoltaicos da Yingli, a maior produtora do item no mundo, e instalar plantas eólicas e solares na região.
Somente nesta semana, Bastos informou que 50 pessoas procuraram a empresa interessadas na micro e minigeração de energia. A última venda foi feita para um motel em Messejana, que terá 240 painéis solares instalados no início de fevereiro. Segundo ele, há também negócios fechados com as mais diferentes empresas, de funerárias e postos de gasolina a metalúrgicas.
"Nós estamos mostrando a alternativa ao empresariado, apresentando aos sindicatos. E tem muita gente nos procurando. Para se ter uma ideia, no dia 10 de fevereiro chegará um contêiner nosso com 820 painéis solares da Yingli Solar, que é nossa parceira chinesa. E já acabamos de pedir outro contêiner", cita. No ano passado, o empresário vendeu uma média de um contêiner a cada dois meses e espera que, em 2015, chegue a um contêiner por mês. "Isso sem contar com um novo modelo que estamos trabalhando para geração de 1 megawatt, que é o limite da minigeração determinado pela Aneel", informa.
Preços competitivos
Para este novo modelo de venda, Bastos informa que está conversando com os fornecedores do exterior para que estes montem parques solares particulares, para produzir energia própria em até 1 megawatt, a preços competitivos. "Já temos oito empresas interessadas no Ceará e duas no Piauí. Queremos fechar os contratos até o fim deste semestre para instalar o primeiro megawatt ainda em 2015", diz.
Ele explica que a empresa fornece e instala os painéis solares para um consumo a partir de 200 kW/h por mês. Os preços, aponta, depende da localização, uma vez que a empresa atua em todo o Nordeste, com uma filial em Recife. Bastos esclarece que bancos financiam este investimento em até 60 meses. "O retorno do investimento é entre sete e 10 anos, dependendo da tarifa do cliente", informa, acrescentando que, diante de todo o quadro energético que se desenha no País, "este é o ano da micro e minigeração".
Peso tributário ainda é entrave
A matriz energética brasileira está, aos poucos, abrindo espaço para matrizes não convencionais de energia, como eólica e solar. Para o presidente do Instituto Acende Brasil, Claudio Sales, a produção solar ainda é incipiente no País, mas tende a crescer, seguindo a trajetória da eólica, que já é comercializada a preços competitivos. No caso da micro e minigeração, contudo, o consultor aponta que ainda há gargalos a serem superados, como o caso da tributação sobre esse tipo de geração.
"Boa parte dos estados tributam o consumidor com o imposto sobre a tarifa final, com todo o seu consumo do mês, mesmo que, parte dele, tenha sido obtido por produção própria, o que é um absurdo", diz. De acordo com ele, a tributação, que inclui os impostos PIS/Cofins e ICMS, deveria incidir somente sobre a energia consumida proveniente da distribuidora, vinda do Sistema Interligado Nacional (SIN), que é o que é feito, por exemplo, no estado do Tocantins. "Não faz sentido tributar o que você mesmo produz e consome", critica.
De acordo com ele, ainda há muito o que aprimorar para que a micro e minigeração se torne mais competitiva. Outra dificuldade que ele aponta são os financiamentos para a compra dos painéis solares. Existem instituições financeiras que fazem empréstimo para esse tipo de equipamento, a exemplo do Santander, mas Sales defende que, com mais bancos envolvidos no negócio, seria possível tomar dinheiro a um custo menos oneroso.
Muito a melhorar
O presidente do Instituto Acende Brasil também destaca que há muito a melhorar no campo da assistência técnica dos painéis fotovoltaicos. "Mas, com o aumento do volume, os padrões de assistência tendem a melhorar", pondera Sales.
Apesar dos obstáculos ainda a serem superados pela chamada geração distribuída, Sales aponta a micro e minigeração como "um passo importantíssimo para o Brasil". "Existem esses contras, mas também há muitos prós, principalmente porque esta é uma energia renovável e que tem muito espaço ainda para crescer no País", conclui.
Fique por dentro
O que pode ser considerado microgeração?
De acordo com a Resolução Normativa nº 482/2012, os microgeradores são aqueles com potência instalada menor ou igual a 100 quilowatts (kW), e os minigeradores, aqueles cujas centrais geradoras possuem de 101 kW a 1 megawatt (MW). As fontes de geração precisam ser renováveis ou com elevada eficiência energética, isto é, com base em energia hidráulica, solar, eólica, biomassa ou cogeração qualificada, diz a Aneel.

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